No final do século 19 havia um grande desconforto em relação ao regime imperial no Brasil. Havia também o Positivismo – uma corrente filosófica que surgiu na Europa como desenvolvimento sociológico do Iluminismo e tinha, entre seus maiores expoentes, o francês Auguste Comte. O pensamento positivista obteve grande sucesso no Brasil; não por ter sido adotado pela maioria da população ou dos intelectuais, mas pelo fato de algumas figuras proeminentes serem positivistas. Entre elas, Miguel Lemos, Nísia Floresta (a primeira feminista brasileira), Euclides da Cunha, o marechal Rondon, Roquette-Pinto e muitos outros.
Foi nesse contexto que surgiu a chamada "bandeira republicana". Ela foi idealizada pelo professor Raimundo Teixeira Mendes (foto), com a colaboração de Miguel Lemos e do astrônomo do Imperial Observatório do Rio de Janeiro, Manuel Pereira Reis. O desenho foi executado pelo pintor Décio Vilares.
Os idealizadores da bandeira insistiram numa "fuga positivista a qualquer imitação norte-americana", preferindo fixar-se na França. A divisa "Ordem e Progresso" por si só já lembraria a França. Sua origem foi o lema positivista de Auguste Comte (foto): "o amor por princípio e a ordem por base; o progresso por fim".
Para atrair a simpatia - e garantir aprovação - Teixeira Mendes e Miguel Lemos pretendiam fazer entender que o criador da bandeira havia sido o General Benjamim Constant. Mas ele foi pouco mais que um intermediário entre os autores do projeto e o Governo Provisório. Constant apenas sugeriu destacar a constelação do Cruzeiro do Sul na bandeira, o que foi feito.
A bandeira foi criada pelo Decreto No 4, de 19 de novembro de 1889, que também estabeleceu as diretrizes para as armas e selos nacionais. A partir de então, o 19 de novembro passou a ser conhecido como "dia da bandeira".
A primeira bandeira republicana foi bordada por D. Flora Simas de Carvalho (foto). Essa bandeira não representou um rompimento definitivo com o Império, mantendo algumas cores e formas geométricas características desse período.
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Aprendemos na escola que o verde da bandeira tem relação com as matas, o amarelo com as riquezas minerais e o azul com o céu. Mas tal relação não remonta a verdadeira origem dessas cores na bandeira.
O retângulo e o losango mantiveram as mesmas tonalidades da bandeira imperial, mostrando que a nova bandeira não rompeu definitivamente com o Império. O losango, em particular, é a representação da mulher na posição de mãe, esposa, irmã e filha.
A esfera é um antigo símbolo do mundo, unindo o Brasil a Portugal através de D. Manuel, em cujo reinado se deu o descobrimento. Ela é também um antigo emblema romano.
O verde da bandeira tem muitos significados, pois remonta o primeiro objeto que provavelmente funcionou como bandeira: ramos de árvores arrancados em instantes de alegria espontânea. Na bandeira do Brasil o verde recorda à Casa de Bragança, a filiação com a França e o estandarte dos Bandeirantes.
O amarelo recorda o período imperial, sendo a representação do Sol. Essa cor recorda à Casa de Habsburgo e também a Casa de Castela e a Casa de Lorena, a que pertencia D. Leopoldina, esposa de D. Pedro I. Combinado ao verde, o amarelo irmaniza-nos com os povos africanos.
O azul também remonta a nacionalidade lusitana, além de homenagear a história do Cristianismo e a mãe de Jesus, padroeira de Portugal e do Brasil. O branco, plenitude das cores, ainda traduz desejos de paz. Veja mais sobre as cores em Construindo a bandeira.
O círculo central em azul (definido apenas como "esfera" no decreto que criou a bandeira) é um antigo emblema usado pelos romanos e que também aparece na bandeira do Principado do Brasil instituída por D. João IV, onde já constava, inclusive, a faixa branca no sentido descendente. Essa faixa confere ao círculo uma perspectiva esférica, ao mesmo tempo em que permite a inscrição da legenda "Ordem e Progresso".
Com a inclusão das constelações, esse círculo se torna uma esfera celeste, ou seja, uma representação do céu.
Uma esfera celeste é um modelo do céu. Trata-se de um globo oco, em cuja superfície desenha-se as constelações, a linha zodiacal, os paralelos e meridianos celestes, fixando-se a Terra no seu centro.
Essa esfera representa a forma como se vê o céu da perspectiva terrestre. Na natureza, é claro, ela não existe. Paralelos e meridianos são linhas imaginárias. O próprio conceito de constelação é ilusório, uma vez que na realidade as estrelas estão a diferentes distâncias. Mesmo assim a esfera celeste tem sido muito utilizada, pois através dela podemos mapear facilmente o céu, dividindo-o em hemisférios e linhas, como fazemos na Terra.
Entre os que tinham saudade da monarquia e os recém-empossados republicanos havia também os católicos, que julgavam o positivismo uma seita. Não foi difícil surgir uma onda de críticas à nova bandeira. Uma polêmica que durou anos e dividiu os brasileiros em torno de seu símbolo nacional. Veja, abaixo, as críticas mais comuns - e as explicações que vão ajudá-lo a compreender melhor a bandeira.
A heráldica é um sistema de combinações de figuras e cores usado em brasões, emblemas e insígnias desde a Idade Média. A bandeira republicana foi muito criticada por fugir a esses padrões, comuns nos símbolos nacionais europeus.
No Brasil, porém, as regras heráldicas não gozaram do mesmo prestígio que tiveram na Europa, uma vez que aqui não existiu Idade Média.
A nova bandeira republicana também estaria desprezando a tradição histórica ao esquecer o período monárquico, conservado até hoje nos símbolos pátrios de outras nações.
Isso é uma meia verdade, pois o verde e amarelo eram as cores do Império, além das figuras geométricas, o losango e o retângulo, que também estavam presentes na bandeira imperial.
A palavra Brasil faz alusão ao pau-brasil, árvore de florada notadamente vermelha. É provável que o nome seja muito anterior ao descobrimento e sua etimologia também faz referência ao vermelho. Por que a bandeira não traz essa cor?
Porque seus autores preferiram preservar as cores da bandeira imperial. No decreto que cria a bandeira diz-se que "as cores da nossa antiga bandeira [...] independentemente da forma de governo, simbolizam a perpetuidade e integridade da pátria entre as outras nações".
Diz-se que as estrelas no círculo azul representam um aspecto do céu como visto da cidade do Rio de Janeiro (então capital do Brasil) no dia 15 de novembro de 1889 (proclamação da República). Mas na verdade as estrelas estão invertidas (espelhadas) em relação ao céu real.
Isso acontece porque o círculo não representa, de fato, um aspecto do céu, mas sim uma esfera celeste - um modelo usado no estudo de astronomia e navegação. Veja também a explicação para a FAIXA DESCENDENTE.
Para muitos, a estrela que aparece isolada acima da faixa com a legenda "Ordem e Progresso" representa (ou deveria representar) Brasília, o Distrito Federal. Mas - surpresa - ela na verdade representa o estado do Pará. Por quê?
Porque o Distrito Federal já está representado por outra estrela simbolicamente muito mais significativa: Sigma do Oitante - a estrela polar do Sul. Ela está sempre no céu, em qualquer dia ou horário, e todas as demais estrelas parecem descrever círculos em volta dela. Um significado bem apropriado para a capital de um país austral.
Se “progresso” combina com “subir na vida”, por que a faixa branca com a legenda está no sentido descendente?
A faixa é uma tradição presente desde antes da bandeira do Principado do Brasil, instituída por D. João IV, e foi concebida para dar uma perspectiva esférica ao círculo azul. E, pensado bem, ela é sim ascendente! Como o círculo representa uma esfera celeste e não uma visão real do céu, a Terra está "por trás" ou "dentro" da bandeira. Desse ponto de vista a inclinação da faixa se inverte. E a posição das estrelas também.
Mesmo enxergando o círculo central da bandeira como uma esfera celeste, percebemos que algumas constelações (notadamente do Escorpião) têm suas estrelas muito mal posicionadas. Por que isso aconteceu?
A pedido de Rui Barbosa, Ministro da Fazenda em 1889, Teixeira Mendes escreveu para o Diário Oficial sua "Apreciação Filosófica", um longo texto onde descrevia o modo como ele próprio entendia a bandeira que criara. Ali ele cita que “não se tratava de construir propriamente uma carta do céu. Era preciso figurar um céu idealizado". Mas, convenhamos, desta vez não há qualquer refutação razoável para tal crítica. As estrelas do Escorpião estão tão deslocadas de sua posição original que a ideia de um "céu idealizado" soa inconsequente. Há várias outras incorreções astronômicas também.
O Positivismo influenciou de forma considerável a sociedade da época. Sendo a Educação a área onde essa influência foi mais marcante. Mas essa corrente filosófica (que defendia que o conhecimento científico era a única forma de conhecimento verdadeiro) foi superada, assim como o próprio determinismo na ciência perdeu força. Por que, então, mantê-lo na bandeira?
Não é justo julgar o passado com os critérios do presente. Vários positivistas participaram do movimento pela Proclamação da República. Por isso o mote “Ordem e Progresso” é de inspiração positivista. Mas a bandeira vai muito além disso em sua história e simbolismos. Retirar a frase porque recorda uma filosofia cujo auge foi há 150 anos é como tentar apagar partes do passado. Certamente isso não nos ajudará a construir um futuro melhor.
Provavelmente, a parte que mais chama a atenção na bandeira do Brasil é o círculo central com o lema e as estrelas. Muitos sabem que cada estrela representa um estado (mais o Distrito Federal). Mas há que pense que são estrelas "genéricas", sem correspondentes no céu - como acontece em muitas bandeiras de outras nações. Mas não. A bandeira do Brasil contém 27 estrelas que pertencem a 9 constelações reais do firmamento. Você pode inclusive vê-las a olho nu. Trata-se da mais completa ilustração celeste já imaginada para uma bandeira nacional. E que você tem a oportunidade de conhecer melhor agora.
Talvez você esteja surpreso com tanto para se aprender sobre a bandeira do Brasil. Mas não se incomode. Você não está sozinho. A maioria dos brasileiros desconhece sua própria bandeira. E poderíamos começar citanto nossos próprios representantes. Por exemplo, nesta página da Presidência da República (Planalto) encontramos: As estrelas, que fazem parte da esfera, representam a constelação Cruzeiro do Sul. [sic]
Mas agora você já sabe: as estrelas que estão na bandeira do Brasil pertencem a 9 (nove) constelações diferentes e não somente uma. Esperamos que a correção no site do Governo Federal venha logo.
Infelizmente incorreções como esta são bastante comuns. Por isso, reunimos abaixo os fatos mais curiosos que a maioria dos brasileiros desconhece (ou se engana) quando o assunto é a BANDEIRA NACIONAL.
O nome da estrela solitária acima do lema "Ordem e Progresso" é Spica (Espiga em grego). Trata-se da principal estrela (Alfa) da constelação de Virgem. Mas ao contrário do que muitos pensam, ela não representa o Distrito Federal na bandeira, mas sim o estado do Pará. E isso não é um erro.
Até mesmo livros didáticos mencionam que a bandeira exibe um "aspecto do céu" na noite da Proclamação da República (15 de novembro), visto da cidade do Rio de Janeiro (capital do Brasil em 1889). Mas na verdade o círculo azul representa uma esfera celeste inclinada conforme a latitude do Rio de Janeiro.
O decreto que criou a bandeira afirma expressamente que as estrelas simbolizam os estados e o Município Neutro. A atribuição de uma estrela para representar cada estado foi estabelecida mais tarde, observando apenas as posições das estrelas no céu e a seqüência geográfica do estados. Saiba mais.
Se a estrela isolada é o Pará, quem representa o Distrito Federal? É Sigma do Oitante, também chamada de estrela polar do Sul. Ela não é muito brilhante, nem está visualmente destacada na bandeira mas, como estrela polar, está sempre no céu (nunca se põe) e todas as outras parecem girar em volta dela.
O verde, amarelo e azul são cores da bandeira imperial, aquela que precede a atual bandeira republicana. Essas cores tem outros significados originais, diferentes daqueles que aprendemos na escola: o verde das matas, o amarelo do ouro e o azul do céu.
A bandeira pode ser atualizada nos termos da Lei 5.700, de 1º de setembro de 1971: cada vez que um estado é criado acrescenta-se uma estrela. Se for extinto, sua estrela é retirada. Ao ocorrer uma fusão, apenas uma estrela permanece para representar o novo estado.
Não são listras alternadas. A fabricação da bandeira obedece a critérios rígidos em relação às dimensões e posição das figuras geométricas, letras e estrelas. O círculo azul com seu lema ainda exige uma costura dupla (frente e verso), tornando a confecção cara e sofisticada. Pelo menos se você quiser fazer certo.
A confecção da bandeira do Brasil obedece regras, principalmente com respeito ao tamanho e posicionamento do losango, círculo, faixa branca e as estrelas. De acordo com a Seção II da Lei nº 5.700, de 1º de setembro de 1971, essas regras podem ser esquematizadas no chamado "Desenho modular" da bandeira (abaixo).
No entanto, não existem referências oficiais com respeito as tonalidades do verde, amarelo e azul. Uma página da Wikipédia chega a especificar valores CMYK e Pantone. Mas não há qualquer menção a eles nas referências citadas. Na verdade, esses valores nem mesmo correspondem aos das bandeiras exibidas na própria página!
Nos anos de 1998 e 2006 o Inmetro realizou análises de conformidade da bandeira do Brasil. Em ambos os testes, não houve muita preocupação com a tonalidade das cores. Uma das empresas analisadas chegou a responder: "Temos o maior interesse em desenvolver em conjunto uma normalização que além de medidas ideais, conste principalmente informações sobre a cor certa (na lei apenas consta verde, amarelo, azul não há uma referência específica para a tonalidade) com isso acabamos vendo por aí, mundo afora, nossa bandeira com cores discrepantes, fora de padrão" (sic).
Na realidade nunca houve um documento oficial que fornecesse um padrão objetivo para as cores presentes na nossa bandeira! Baseado nos modelos fornecidos em sites do Governo Federal e na suposição de que essas cores tendem a ser puras, sugerimos os seguintes valores para o verde, o amarelo e o azul da bandeira (clique nos links ou veja a Imagem 4, a seguir).
Acreditamos que conhecer melhor a bandeira do Brasil e o seu simbolismo é um mergulho na história. Mais que isso. Educadores irão encontrar na bandeira elementos de astronomia de posição, matemática, geometria, geografia e filosofia. A bandeira ainda desperta curiosidade sobre o firmamento e pode ser o ponto de partida para um rico aprendizado. Se você compartilha conosco essa visão entre em contato. Queremos saber sua opinião, sugestões e críticas para aprimorar esse trabalho. Vamos valorizar essa bandeira ─ que representa um país e não um governo.
Este trabalho é de autoria de José Roberto de V. Costa – www.zenite.nu. Todos os Direitos Reservados.
Referências:
♦ Coimbra, R. O. A Bandeira do Brasil. Rio de Janeiro: Fundação IBGE, 1972. 502 p.
♦ Bandeira do Brasil. In: Wikipédia, a enciclopédia livre.. Disponível em <https://pt.wikipedia.org/wiki/Bandeira_do_Brasil>. Acesso em 28 mai 2014.
♦ Evolução da bandeira do Brasil. In: Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em <https://pt.wikipedia.org/wiki/Evolução_da_bandeira_do_Brasil>. Acesso em 28 mai 2014.
♦ O Positivismo e sua influência no Brasil. In: Espaço Único. Disponível em <https://www.espacounicocriativo.com/2010/12/o-positivismo-e-sua-influencia-no.html>. Acesso em 26 mai 2014.
♦ Lei No 5.700. In: Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5700.htm>. Acesso em 11 jun 2014.
♦ Bandeira do Brasil II. In: Inmetro - Informação ao Consumidor. Disponível em <https://www.inmetro.gov.br/consumidor/produtos/bandeira_nacional.asp>. Acesso em 11 jun 2014.